Medicina Transfusional
Terapia transfusional e emergências transfusionais
A anemia e a trombocitopenia estão associadas a condições clínicas adversas. A transfusão é apenas um tratamento de curto prazo e as decisões sobre transfusões devem ser baseadas em dados clínicos. É essencial avaliar e tratar, quando possível, a causa subjacente da anemia e da trombocitopenia.
Os pacientes devem ser avaliados clinicamente quando a transfusão for considerada. Se o paciente estiver estável, a transfusão pode não ser necessária mesmo quando o nível de hemoglobina for de 7 a 8 g/dL e a contagem de plaquetas estiver abaixo de 50.000/mm3.
Isso se aplica a indivíduos com doença cardiovascular subjacente submetidos a cirurgia ortopédica ou cirurgia cardíaca, pacientes ambulatoriais e indivíduos com sangramento gastrointestinal hemodinamicamente estáveis. Na maioria dos casos, mantemos uma hemoglobina ≥7 a 8 g/dL em vez de >10 g/dL.
Já os pacientes sintomáticos com doença coronária e com hemoglobina <10 g/dL devem ser transfundidos para melhorar a instabilidade hemodinâmica e os sintomas de isquemia miocárdica.
O mesmo ocorre para a transfusão de plaquetas: a transfusão ocorre em caso de sangramento com contagem plaquetária abaixo de 50.000/mm3, se houver febre com níveis plaquetários menores que 20.000/mm3 e abaixo de 10.000/mm3. No entanto, existem exceções.
A transfusão de uma unidade de hemácias por vez é razoável para pacientes hemodinamicamente estáveis, com avaliação dos sintomas imediatamente após a transfusão e níveis de hemoglobina pós-transfusão, que podem ser feitos a partir de 15 minutos após transfusão.
Em caso de transfusão de concentrados de plaquetas, costuma-se fazer uma unidade para cada 10 kg do paciente (por exemplo, um paciente com 60 kg deve receber seis unidades de concentrados de plaquetas) ou uma unidade coletada por aférese, que é um procedimento realizado em banco de sangue onde se retiram somente as plaquetas e os outros elementos do sangue voltam para o doador.
Entretanto, a transfusão sanguínea não é um procedimento sem riscos e complicações tanto agudas como tardias. Por isso, deve ser muito bem indicada.
As reações transfusionais agudas variam de incômodas, mas clinicamente benignas, a reações com risco de vida. A natureza da reação pode não ser imediatamente aparente, porque muitas reações, incluindo as reações mais graves, começam com sintomas inespecíficos, como febre ou calafrios.
A frequência das reações varia de reações relativamente comuns, como reações transfusionais alérgicas e reações febris não hemolíticas. Há complicações raras, incluindo anafilaxia, reações transfusionais hemolíticas agudas incompatíveis com ABO fatais e sepse.
Uma reação transfusional aguda deve ser considerado em qualquer paciente que desenvolva sinais e sintomas adversos durante ou dentro de 24 horas após a conclusão de uma transfusão. Muitas das reações mais graves ocorrem nos primeiros 15 minutos após a transfusão.
Na suspeita de reação transfusional aguda, deve-se parar a transfusão imediatamente, manter uma via venosa, informar ao banco de sangue, confirmar o produto correto e afazer a avaliação clínica do paciente.
A avaliação inicial do paciente e os aspectos relevantes da história clínica são utilizados para determinar a(s) reação(ões) mais provável(is).
Por exemplo, febre e calafrios sugerem reação febril não hemolítica, reação transfusional séptica, lesão pulmonar aguda relacionada à transfusão (TRALI) ou incompatibilidade ABO. AHTR, sepse e TRALI são potencialmente fatais. As reações febris não hemolíticas são menos graves, mas na maioria das vezes é um diagnóstico de exclusão. A febre também pode estar associada à doença subjacente do paciente.
Já os sintomas respiratórios caracterizam TRALI. A TRALI é mais provável em pacientes com desconforto respiratório desproporcional ao volume de fluido recebido ou no início da transfusão. Outros achados na TRALI incluem desconforto respiratório de início súbito, febre, hipotensão e secreções róseas e espumosas das vias aéreas. Para o seu diagnóstico e para diferenciar de sobrecarga de volume relacionado à transfusão sanguínea, um diagnóstico de TRALI requer hipoxemia e uma radiografia de tórax anormal mostrando infiltrados bilaterais e sem hipertensão atrial esquerda.
Uma queda significativa na pressão arterial sistólica (>30 mmHg) é característica de incompatibilidade ABO, TRALI e sepse. A hipotensão também pode ser decorrente de sangramento ou depleção de volume, em vez de uma reação transfusional. As reações transfusionais hipotensivas também podem ser responsáveis, embora sejam muito raras.
As amostras laboratoriais para avaliação de suspeita de reação transfusional devem ser acompanhadas de informações sobre o histórico do paciente e a reação. O banco de sangue fará uma verificação da reação transfusional, repetirá o teste ABO, juntamente com uma verificação visual para hemólise e um teste direto de antiglobulina (Coombs). Testes adicionais e manejo preliminar dependerão do tipo de reação suspeita.